ESCOLA - NEM SEMPRE RISONHA - Breve história da educação




A
 necessidade de transmitir às gerações mais jovens o conhecimento já adquirido pelos mais velhos aparece em todas as culturas: antigas, modernas e até primitivas. Nestas, a função de transmitir e educar cabe ao grupo social em seu todo. O convívio e o senso de imitação possibilitam às crianças assimilar o uso técnico dos adultos. A educação é informal: assim como aprende a falar, a criança aprende a viver dentro dos padrões e ideias da tribo. Hoje, entretanto, a educação está tão identificada com a escola, que se torna difícil reconhece-la como função espontânea da sociedade. Antigamente, a educação se caracterizava por seus traços conservadores e tradicionais. Mas na sociedade moderna ela é um processo social que dura praticamente a vida inteira. Desde a adaptação do indivíduo ao seu meio, no âmbito familiar, até a instrução técnica especializada, no âmbito escolar, a educação evolui à medida que a sociedade se transforma e diversifica. Geralmente, nas antigas civilizações a educação era um instrumento de preparo das elites religiosas e políticas. No antigo Egito, por exemplo, medir as terras cultiváveis era imprescindível para planejar a agricultura em função das cheias do rio Nilo. Formou-se assim uma classe especializada nisso: uma parte da juventude era educada para integrar a classe dos sacerdotes e dos administradores. Por outro lado, o restante da população só recebia a transmissão informal das técnicas de trabalho braçal e dos costumes sociais. A escola assume um papel instrumental, limitado a uma elite restrita. Também na Índia, a instrução superior era privilégio dos futuros sacerdotes – brâmanes -, que além dos textos sagrados aprendiam medicina, astronomia e matemática. Na Pérsia e na China, as crianças das classes superiores eram confiadas a chefes distritais para serem educadas sob sua orientação direta, a partir de 7 anos ou 10 anos de idade.


À medida que as civilizações progridem, a educação se diversifica cada vez mais. Um dos primeiros lugares onde o sistema educacional atinge elevado grau de diferenciação é na Grécia. Não apenas as classes dirigentes, mas toda a população considerada “livre” passa a ter acesso à escola, que se torna estatal e pública. Nas cidades-estado gregas, com a evolução do comércio, a educação passa a preocupar o governo. Em algumas cidades organização social assemelhava-se a um acampamento militar: a educação tinha por objetivo estimular as virtudes guerreiras. Em Esparta esta tendência foi levada ao máximo: a educação adotava métodos rígidos e brutais, para formar guerreiros fortes e corajosos; desde cedo, sob a tutela oficial, os meninos preparavam-se para ser soldados e as meninas esposas e mães de soldados.
A disciplina era menos severa em Atenas do que em Esparta, mas o ideal de perfeição física mantinha-se intacto. Haviam leis que regulavam a frequências às escolas dos filhos de cidadãos livres. Para o corpo era fundamental a ginástica, enquanto o cultivo do espírito se dava pela filosofia, arte e literatura, disciplinas componentes da Música, isto é, protegida pelas musas. Acredita-se que por volta de 600 a.C. surgiu na Grécia a escola elementar, destinada a complementar o ensino feito através da tradição oral. É nessa época que as letras incorporam à educação dos nobres, mas acima deles permanecem as armas. O filho do nobre, era de fato o cidadão livre, seguia um programa de ensino elementar e exercícios físicos até os 14 anos; ginásio até os 16, preparo para as futuras funções políticas e militares até os 18; cidadania a partir dos 20. Essa formação visava apenas o preparo de dirigentes, pois para este nobre, proprietários de terras e escravos, o trabalho era uma desonra.


No século V a.C., a ascensão dos metecos vem alterar o panorama. Estrangeiros e comerciantes que trabalham duro para vencer, os metecos passam a influenciar a educação: é abolido o castigo a chicotadas[1] e a escola muda gradualmente de feição, abrindo suas portas para os filhos da nova classe. O que já é um reflexo de suas conquistas no campo social. Quando os romanos conquistaram a Grécia, no século II a.C., a cultura grega tornou-se a base da educação em Roma, e muitos jovens romanos iam estudar em Atenas ou Alexandria, então mais importante centro helenístico do Mediterrâneo.
Nas escolas elementares de Roma, que já existiam antes do Império, as crianças eram orientadas pelo ludimagister e a partir dos 16 anos conviviam com o retor (donde a palavra – reitor) para aprender eloquência, direito, história e filosofia. O jovem rico dedicava-se a isto o resto da vida. A educação subordinou-se ao Estado a partir de 362, sob Juliano, quando a aprovação do imperador se tornou necessária para a nomeação dos professores.

Dentro do mosteiro, a escola



Com a fragmentação do Império Romano, sob o impacto das invasões bárbaras (século IV e V), a educação muda suas características: a formação de funcionários e administradores governamentais perde sua função e aos poucos desaparecem as escolas subvencionadas pelo Estado. Inclusive, porque não há mais estado unificado e centralizado. Umas das poucas instituições que conseguem manter a sua unidade é a Igreja. Os mosteiros multiplicavam-se por todos os pontos da Europa antes ocupados pelas legiões romanas. No século VII já havia, dentro deles, certa especialização: alguns monges se dedicavam ao estudo e ao culto religioso, enquanto outros se encarregavam dos demais trabalhos (limpeza, produção de gêneros e de vinho, etc.). Nos mosteiros é que aparecem as primeiras escolas da Idade Média, divididas em duas categorias: as “interiores” preparavam futuros monges e as “exteriores” – conhecidas como escolas monásticas – ministravam instrução ao povo. Nela não se ensinava a ler nem a escrever. Sua única finalidade era ensinar a doutrina cristã. E os que não fossem filhos de servos podiam aprender e leitura e a escrita ingressando num convento. Aí, nas escolas interiores, é que se ensinavam canto, latim e então chamadas “artes liberais”: gramática, dialética e retórica.[1]


Como ser um cavaleiro


No entanto, ser analfabeto não era um problema para os nobres feudais. Suas ocupações (caça, guerra, equitação, torneios, poesia, jogos) dispensavam perfeitamente conhecimentos maiores do que os adquiridos no convívio familiar. O jovem[2] nobre só saía do convívio familiar quando entrava a serviço de um cavaleiro, como pajem. Aos 14 anos era promovido escudeiro e nessa qualidade acompanhava o amo aos torneios e à guerra. Assim aprendia o necessário para ser amado cavaleiro, por volta dos 21 anos. O perfeito manejo das armas, a arte da esgrima e as boas maneiras na corte o tornavam respeitável aos olhos de seus administradores e vassalos. O cavaleiro medieval também era um cavalheiro em pleno sentido do termo.

A educação catedralícias


Até o século X, a maioria das cidades não passava de vilas onde moravam poucos artesãos. A partir do século XI, o florescimento do comércio transformou essas vilas ou burgos em movimentados e populosos centros. Os burgueses – habitantes dos burgos -, enriquecidos pela atividade comercial, modificaram o estilo de vida mantido pela nobreza feudal, causando repercussões no sistema de educação. A Igreja viu-se na necessidade de instalar escolas juntos às catedrais, passando o ensino das mãos dos monges para o clero secular. Na verdade, essas escolas catedralícias já existiam desde o tempo de Carlos Magno (século VIII), que ordenara aos mosteiros que abrissem escolas “exteriores”. Mas, tal como nos conventos, a preocupação central era a teologia.

A origem da universidade


Sob influência da burguesia, os artesãos e comerciantes passam a se associar em corporações, onde mestres e aprendizes se reúnem para ler, estudar e discutir. Qualquer assembleia corporativa era denominada universidade (universitas) e punha seus membros a par de novos conhecimentos científicos. Dessa maneira surge no século XII a Universidade dos Mestres e Estudantes, de Bolonha, a primeira de uma série: no século XIV já havia mais de 30 espalhadas pela Europa. Como todas as corporações de ofício, essas universidades submetiam seus alunos a uma sucessão de provas e testes, que garantiam ao jovem, sucessivamente, graus de bacharel, licenciado e doutor.
Fortalecendo seus êxitos econômicos, os burgueses adquiriam assim uma posição de liderança cultural. As cidades passaram a eleger seus representantes e embaixadores entre os mais ilustres doutores em direito, o que até então fora privilégio do clero.


A expansão das universidades produziu modificações fundamentais nas escolas primárias, que em meados do século XIII passaram a ser custeadas e administradas pelo município. O latim ficou restrito às escolas eclesiásticas, e os novos centros de ensino deram mais importância ao idioma nacional, ao mesmo tempo que desenvolviam os campos da aritmética, geografia e contabilidade. Mas a formação técnica dos artesãos ainda era dada nas oficinas em que os aprendizes imitavam os mestres.
A mentalidade burguesa, com seu interesse pelos negócios, pela vida prática e pela investigação nacional, adquire um caráter de inovação durante o Renascimento. Por volta do século XV, o despertar da cultura greco-romana, exaltando o valor da personalidade humana, reflete-se na educação. Até então era indiscutível a autoridade do mestre. Agora surge um estudo mais pessoal, baseado no raciocínio e no espirito crítico. Esse tipo de educação inclui a mulher, que passa – embora ainda timidamente – a participar da vida intelectual, abandonando o papel decorativo da donzela medieval. Muitos programas novos de ensino foram elaborados e as escolas abertas obedeciam à nova orientação. A primeira foi provavelmente a Casa Gioiosa (Casa Alegre), fundada em Mântua por Vitorino da Feltre (1378-1446). O próprio nome da escola indica seu tipo de educação: livre e franca, interessante e não cansativa. Em seu programa havia também uma série de exercícios físicos, para desenvolver a agilidade melhorar o rendimento no ensino.

Reforma da educação


No século XVI há um novo movimento cultural de grande importância na história da educação: a Reforma protestante. Seu líder, Martinho Lutero (1483-1546), defendia o “livre exame” dos textos sagrados, que então passaram a ser analisados independentemente da autoridade da Igreja. Muitas escolas foram criadas para a difusão da doutrina protestante, exigindo igual esforço por parte dos católicos. A recém-fundada ordem dos jesuítas dedica-se intensamente à educação, criando escolas desde o nível elementar até às universidades. Nesta época inicia-se a conquista de novos territórios e a educação foi um importante aliado dos colonizadores: é bem conhecida ação dos jesuítas no Brasil colonial. Outras ordens religiosas interessaram-se pela difusão do ensino, e a que foi criada por Jean-Baptiste de La Salle (1651-1719 – sob o nome de Irmãos das Escolas Cristãs – organizou escolas rurais destinadas aos filhos de camponeses, levando a educação ao povo, embora ao preço de severos castigos corporais.



No século XVII, o educador tcheco Jan Komensky – chamado em latim de Comenius (1592-1670) – propôs um novo sistema educacional, fundado em vários graus: escola maternal, escola elementar, escola de latim (correspondente ao atual secundário) e por fim universidade. Em traços gerais, é a graduação seguida ainda hoje. A tese de que a instrução básica devia ser extensiva a todas as crianças, sem distinção de sexo ou fortuna, triunfa no século XVIII, graças aos enciclopedistas e ao filósofo Jean-Jacques Rousseau (1712-1778). O suíço Pestalozzi (1746-1827) é um dos primeiros a estudar a educação infantil. Com o desenvolvimento industrial, coloca-se o problema de atender aos filhos das mulheres empregadas. Daí nascerá a educação moderna.



[1] As artes liberais aqui mencionadas correspondiam ao Trivium – do latim,  três vias – para se chegar a verdade. Era composto por Gramática, Retórica e dialética. Enquanto que o Quadrivium – do latim, quatro vias – era composto de Aritmética, Geometria, Astronomia e Música; formando as sete artes liberais.
[2] Na Idade Média, o sonho de todos os meninos era tornar-se monge ou cavaleiro.




[1] Principalmente em Roma, onde os castigos eram severos. Era comum o uso da férula (palmatória) como forma de castigar os indisciplinados. Em casos mais graves, o magister – em latim, mestre – em muitos casos pedia a ajuda de dois escravos para segurar o aluno e em seguida açoita-lo. Em muitos países da atualidade ainda há imposições de castigos severos e muitas vezes desumanos aos alunos com mau comportamento. Por exemplo, a Inglaterra, mesmo as escolas particulares, castiga seus alunos com golpes de palmatória. Nas escolas de Israel e Oriente Médio, os professores chegam a amarrar os alunos nas carteiras como forma de castigo, além de estupros entre outras formas de castigos. Um caso muito extravagante foi  o diretor que deixou uma menina de cabeça invertida durante quatro horas, porque desconfiou que ela tinha roubado uma maçã.

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